Baseado no celebre conto de Madame LePrince de Beaumont foi recentemente exibido em Lourenço Marques A Bela e O Monstro de Jean Cocteau, filme obteve o premio Delluc. no festival de Cannes, onde se estreou George Auric e René Clement, para os títulos de melhor autor musical e o Conselheiro Técnico, autor de Les Enfants Terribles, quis contar cinematograficamente um conto de fadas. Ele próprio, logo no inicio da projeção, dedica o filme ao que ainda em nos resta de criança. Simplesmente contou para adultos, tanto assim que o Monstro com quem nos deparamos na película, não é de maneira alguma aquele monstro mau da nossa infância, só espera que o desencante, mas um monstro visto de bons e maus sentimentos, em que uma parte tenta subjugar a outra. Assistimos a uma luta travada no interior da fera, uma luta intensa em que esta sofre e se sente por vezes inconsciente para resistir, mas o seu amor pela Bela encoraja-o e é ela que vê essa luta, compadece-se apesar da repulsa que lhe causa o seu aspecto exterior.
Não é mais o Monstro do conto de Madame Beaumont, é o Monstro humano de Cocteau. Aqui será bom fazer uma pausa e uma pergunta: terá Cocteau qualquer intenção nessa sua interpretação do Monstro como de todo o filme? A quem diga que sim e quem ...afirme que não. Uns são de opinião de que o poeta quiz dizer mais alguma coisa do que narrar um simples conto de Fera, que nos diálogos da Fera e da Bela da autoria de Cocteau se notam alusões mais profundas, inatingíveis por vezes, é possível.
O que nós vimos não é textualmente o conto A Bela e A Fera de Madame Beaumon. É uma interpretação cinematográfica deste conto e essa transposição não nos da mais os personagens padrões dos contos infantis, onde o mau é só mau, e o bom simplesmente bom. Mas se assim é, podem dizer, já não se trata de um conto de fadas, também não é verdade, onde nós notamos sua alteração é unicamente na Fera, de resto os personagens demais permaneceram na mesma, além disso todas as representações e figurações estranhas com que deparamos no decorrer do filme, tanto podem ser unicamente a fim de dar o ambiente de irrealidade (refiro-me especialmente ao palácio do monstro) como podem ter um significado especial, mas sendo assim, que mundo de conclusões se não podem tirar dos próprios efeitos especiais usados com bastante discrição poderemos ver alusões aos simples recursos técnicos para ajuda do poético.
Em vez de nos perdermos nessa sutilezas que passam despercebidas à grande maioria, cremos tratar-se da narrativa de um conto de fadas. No entanto o filme não é de maneira alguma uma película para crianças, temos mesmo a impressão que uma criança não o perceberia, salvo alguma cenas e mesmo essas com dificuldades.Por que Cocteau contou com elevação, apesar da linguagem cinematográfica se apresentar por vezes deficiente, proveniente a maior parte das vezes do mal aproveitamento dos planos. Em compensação temos seqüências que só por si são verdadeiros poemas de imagem, referimos particularmente o passeio da Bela pelo Castelo com as cortinas do vestido branco batidos pelo vento, temos também de destacar o esplendido trabalho de Jean Marais quando Monstro e a dicção e a expressão do olhar são absolutamente corretas. Aproveitamos, a essa altura, para salientar a esplendida musica de Georges Auric que reforça poderosamente as imagens e a mascara do monstro, que de longe vista,convence perfeitamente.
O que é de lamentar é a parte final em que o príncipe encantado surge com a configuração de apaixonado pela Bela, e este se transforma em monstro, também aqui se pode dar uma explicação, mas segundo nos consta esse artifício foi devido a Jean Marais não se contentar apenas em desempenhar o papel de monstro e queria a todo custo, no decorrer da película, que se visse o seu belo rosto.
O que resulta de tudo isso é uma demasiada semelhança com o Retrato de Dorian Gray ( é de notar que a explicação da transformação entre o Quadro e Dorian Gray servem perfeitamente para o caso da Bela e o Monstro).
Josette Day é a artista que faz de Bela, sem ser uma daquelas belezas absolutamente irrepreensíveis, e indiscutivelmente bela e o seu trabalho satisfaz em absoluto, as suas irmãs más, sedentas de luxo e riqueza estão bem tratadas pelas interpretes, quanto ao irmão... é um autentico menino diabólico.
A fotografia coube a Henri Alekan que se soube conduzir com acerto, embora com determinadas cenas demasiadas escuras e os cenários e indumentárias a Christian Berard.
Para terminar agradecemos a Empresa do Templo Varietá e vinda dessa obra, esperamos que os resultados materiais dessa projeção encorajem a fazer nos filmes mais representativos no atual cinema francês como A Batalha do Reio, Farrebique, Manon, etc.