"Eu te amo", acho que são as três palavras mais difíceis de serem ditas, em alto e bom som.
Palavrão, qualquer um grita, berra, se expõe. Insulto é moeda corrente.
Mas quando chega na hora de falar de amor, quase todo o mundo amarela.
Há poucos dias foi o meu aniversário.
Embora eu me ache um garoto, como qualquer um se considera a si mesmo, cheguei a um número de anos que já dá um certo pudor festejar. Acho até que deveria ser o contrário, e que a cada década se devia ganhar uma espécie de medalha, pelo simples fato de estar vivo. Lembro que um dia li que os chineses aguardam impacientes o meio século de vida, considerado glorioso. Mas por lá o luto é de branco que se comemora, velhice é sabedoria e não senilidade... e se come cachorro. Quer dizer, cada roca com seu fuso - provérbio da minha infância que a maioria vai ter de ler três vezes para não ter a certeza de ter entendido.
Claro que isso de idade é muito relativo.
A minha irmã mais velha, que sempre me considerou um pouco como um filho seu pelos cinco anos que nos separam (7 a 2 é um escore considerável), não há muito tempo me devolveu uma carta que escrevi quando tinha os meus 8 anos de idade, em que comentava o aniversário de uma amiguinha minha, em casa de quem estava passando férias. Guardo a suave lembrança de uma ardente paixão não correspondida, que exorcizava numa concisa frase, escrita numa caligrafia incerta. Escrevi, textualmente:
"A Suzete fez ontem 12 anos. Está velha."
Chamo a atenção para o sábio uso do ponto final, antes da sentença definitiva, amarga vingança do meu amor ignorado.
Lembro também, agora sem ternura mas com uma certa tristeza, que nunca fui capaz de revelar os meus inúteis sentimentos a Suzete.
É natural, dirá quem lê.
Não é, não.
Devíamos ser forjados na coragem das declarações de amor, e não no medo do repúdio. Devíamos ter a coragem de gritar aos quatro ventos o nosso amor pela mulher que nos emociona, pela flor que nos deslumbra, pelo por do sol que nos cala. E não jogar sempre pelo seguro, com medo do ridículo de ser desprezado, de ser considerado de través, de nos interpretarem mal.
Eu também acho que não tem nada mais ridículo que um homem apaixonado.
Eu também acho que não tem nada mais ridículo que um homem com um ramo de flores na mão, esperando a mulher que não aparece ao encontro.
Eu também acho que não tem nada mais ridículo do que homem embevecido com um por de sol de cartão postal.
Mas também acho, hoje - depois de muitas cabeçadas na parede - que o ridículo está em quem o vê assim.
Foram precisas muitas estradas percorridas, para compreender uma coisa tão simples. Que não temos a coragem dos poetas, que não é outra senão a de virar as coisas do avesso, para que as vejamos em toda a sua simplicidade.
Que somos mais facilmente valentes quando nos defrontamos com a violência, que com a ternura. Que uma declaração de amor nos assusta mais que uma ponta de faca.
Só há relativamente poucos anos descobri as flores.
Um dia, a propósito de nada, recebi umas flores de uma amiga. Friso, amiga, nem sequer namorada. Foi uma experiencia traumática. Um deslumbramento.
A partir desse simples fato reformulei toda uma linguagem afetiva. Só não mando mais flores, por desleixo, mas pelo menos me consolo que tenho sempre dado flores a minhas filhas, desde a mais tenra idade.
E se me querem ver feliz é oferecerem-me uma flor.
Suspeito que vai haver uns sorrisinhos marotos diante desta afirmação. Homem não gosta de flores. Eu gosto, e digo. E mais, me orgulho de ter descoberto esse prazer. Como me orgulho de ser capaz de dizer em voz alta, sem receio de ouvidos indiscretos, "eu te amo", quando amo.
No dia do meu aniversário, sou Leão com ascendente Leão e não sei muito bem o que isso significa porque nada entendo de signos e nem sei mesmo se acredito em astrologia, tive vários momentos gratificantes. Aqui, neste contexto, lembro apenas as papoulas que recebi de minha filha Janaína, e um livro, oferecido por um grande amigo.
A dedicatória, que eu gostaria de merecer, fechava com essas mágicas palavras: "eu te amo".
Um amigo, sem medo dos sentimentos ou de mal entendidos, um homem com a coragem dos poetas.
É um "eu te amo" que envio à escritora MAZA DE PALERMO, "os olhos sujos de neve, sujos de mortos", pela coragem da palavra exata dos poemas de concreto do seu livro "CAVALLA".